«Se o PSD persistir em não ir sozinho a eleições, não é de excluir, por mais improvável que isso pareça, que o PS responda na mesma moeda, inaugurando uma era de coligações eleitorais à direita e à esquerda.
1. A aliança de governo de esquerda em negociação é obviamente uma resposta à aliança pré-eleitoral e pós-eleitoral da direita. O PSD coligou-se à direita para suplantar o PS; este alia-se à sua esquerda para suplantar a aliança de direita. Obviamente, o PSD não contava com este contra-movimento do PS, mas isso não elimina a sua “responsabilidade” neste terramoto político, de imprevisíveis consequências. Além de ter inviabilizado à partida qualquer entendimento de governo entre o PSD e o PS, a união da direita “obrigou” o PS a procurar um antídoto para o seu isolamento eleitoral.
É evidente que a coligação pré-eleitoral da direita – que já não acontecia desde há 35 anos (Aliança Democrática de 1979 e 1980) – ameaça gravemente as possibilidades eleitorais do PS. Nas 14 eleições parlamentares até agora realizadas desde 1976 só em três delas (1995, 1999 e 2005) é que o PS suplantou os dois partidos da direita somados. Acresce que a coligação pré-eleitoral destes potencia ainda mais a vantagem dos dois partidos, como se viu agora.
Por isso, se aceitasse esta situação sem reagir, o PS arriscava-se a perder quatro em cada cinco eleições para a direita unida. A resposta consistiu em tentar uma união de esquerda, rompendo o tabu até agora existente. Se esta arriscada aposta resultar, não é ocioso pensar que a vida política portuguesa, até agora protagonizada pela disputa entre o PS e o PSD, pode vir a centrar-se na disputa entre dois blocos partidários, à francesa.
2. Se o PSD persistir em não ir sozinho a eleições, não é de excluir, por mais improvável que isso pareça, que o PS responda na mesma moeda, inaugurando uma era de coligações eleitorais à direita e à esquerda.
A verificar-se essa evolução, talvez seja de pensar em facilitar e flexibilizar as coligações eleitorais. Actualmente as coligações eleitorais implicam a apresentação de uma lista única (que nunca é fácil de negociar), com um programa eleitoral comum e uma campanha eleitoral comum. Além disso, no final não é possível saber quanto vale cada partido, visto que os votos são na coligação. Por último, esse “casamento eleitoral” inibe politicamente uma rutura pós-eleitoral, impedindo arranjos com terceiros partidos (como se verificou agora).
Ora, há uma alternativa de coligação eleitoral mais flexível, a chamada “coligação de listas”. Os partidos coligados continuam a apresentar-se autonomamente a eleições com as suas próprias listas, programas e campanhas. No final, porém, eles somam os seus votos para efeitos de repartição de deputados, como se fossem uma única força política, dividindo depois entre si os deputados ganhos conforme os votos de cada um. Esta fórmula tem as vantagens da coligação (maximizar o número de deputados eleitos) sem diluir a identidade dos partidos. Obviamente, essas coligações devem ser formalizadas como as outras e devidamente anunciadas aos eleitores.
As coligações de listas podem ser a terceira via virtuosa entre a ida separada às urnas e o “casamento eleitoral” que as actuais coligações de partidos impõem.»
Considero como bastante improvável, senão mesmo impossível, que um dos mais reputados constitucionalistas portugueses vertesse para a opinião pública uma "alternativa de coligação eleitoral mais flexível", que entendeu denominar por "coligação de listas", sem que, antecipada e cuidadosamente, se debruçasse sobre a sua absoluta e inquestionável compatibilidade com as normas da CRP.
A confirmação deste meu prisma de observação, surgiu quase de imediato, com a adenda que o próprio Vital Moreira publicou no blog Causa Nossa:
Adenda
«Um leitor objecta que a coligação eleitoral light que eu proponho (coligação de listas) é inconstitucional porque a Constituição só refere a "coligação de partidos" e que ela não vai avançar porque precisa de maioria de 2/3 na AR.
Mas não tem razão. Primeiro, a Constituição não proíbe tal mecanismo e só se refere às coligações de partidos para prever a apresentação de deputados em lista conjunta, não excluindo portanto coligações que não impliquem lista conjunta. Segundo, esta matéria não precisa de maioria de 2/3 e, de qualquer modo, não percebo por que é que algum partido se oporá a esta solução, que em abstracto é tão útil à esquerda como à direita.»
Pelas repercussões e até impropérios que a ideia de Vital Moreira está a ter nas hostes da nossa empedernida e retrógrada Direita, é minha forte convicção de que não deverá tardar muito para que a matéria venha a ser colocada de modo formal ao Tribunal Constitucional, no sentido de que seja estabelecida a necessária jurisprudência e possa ser prevenida a repetição das cenas a que temos vindo a assistir, em defesa da nossa "sacrossanta tradição constitucional", sempre que os interesses da Direita o determinam!...
«Um leitor objecta que a coligação eleitoral light que eu proponho (coligação de listas) é inconstitucional porque a Constituição só refere a "coligação de partidos" e que ela não vai avançar porque precisa de maioria de 2/3 na AR.
Mas não tem razão. Primeiro, a Constituição não proíbe tal mecanismo e só se refere às coligações de partidos para prever a apresentação de deputados em lista conjunta, não excluindo portanto coligações que não impliquem lista conjunta. Segundo, esta matéria não precisa de maioria de 2/3 e, de qualquer modo, não percebo por que é que algum partido se oporá a esta solução, que em abstracto é tão útil à esquerda como à direita.»
Pelas repercussões e até impropérios que a ideia de Vital Moreira está a ter nas hostes da nossa empedernida e retrógrada Direita, é minha forte convicção de que não deverá tardar muito para que a matéria venha a ser colocada de modo formal ao Tribunal Constitucional, no sentido de que seja estabelecida a necessária jurisprudência e possa ser prevenida a repetição das cenas a que temos vindo a assistir, em defesa da nossa "sacrossanta tradição constitucional", sempre que os interesses da Direita o determinam!...
Como se a Constituição da República Portuguesa pudesse ter apenas uma e só uma leitura: a da Direita, naturalmente! Porque sempre que Esquerda procura, mesmo que dentro do mais rigoroso respeito pelo quadro definido pela CRP, contornar a "chica-espertice" da Direita, isso será sempre... uma flagrante violação da nossa "tradição democrática" e um puro e duro "atropelo constitucional", senão mesmo... "golpe de estado"!...
Aqui do meu canto, agarrado à minha memória, apetece-me perguntar...
Quantos chumbos do Tribunal Constitucional coleccionou a Direita na última legislatura?!...
Até breve
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