sexta-feira, 29 de março de 2013

O debate inadiável


                                                    QUE FUTURO PARA PORTUGAL?
 

A crise de Chipre, mais do que qualquer outra ocorrida no espaço da zona euro nestes últimos três anos, teve a vantagem de mostrar a verdadeira face dos “patrões do euro”, depois de terem reduzido à sua insignificância aqueles que, continuando a pertencer à moeda comum, nela simplesmente vegetam como uma espécie de novos “untermenschen”, sendo nesta nova modalidade o trabalho escravo substituído pela espiral recessiva e pela agiotagem. A crise de Chipre e a 7.ª avaliação da Troika, as suas reticências, as novas exigências e as recriminações feitas a um governo servil, que tudo, mas tudo, fez nestes últimos dois anos para agradar aos “patrões do euro”, não podem deixar de colocar na ordem do dia a seguinte pergunta: Que futuro para Portugal?

Se perante um governo subserviente a Troika não teve qualquer problema em se distanciar dos resultados de um programa que ela própria impôs e que foi levado à prática com um zelo e uma dedicação dificeis de igualar pela própria Troika, se a ela lhe coubesse executar a sua própria imposição, nenhum português com um mínimo de lucidez deixará de perceber que o que ai vem a seguir será ainda pior e tanto mais quanto pior for o resultado das novas e sucessivas imposições.

Estamos perante um atentado não apenas à soberania da Pátria e aos tratados constitutivos da União Europeia (por muito maus que eles sejam), mas também à própria integridade física e moral das pessoas. Ninguém poderá aguentar por mais tempo este estado de coisas, nem ninguém poderá continuar a mentir, apresentando falsas ou ilusórias soluções para resolver um problema que não tem qualquer hipótese de solução no seio da Europa.

Desde há muito que no espaço livre e sem censura da blogosfera e das redes sociais em escritos mais ou menos fundamentados se tem apontado para o abandono do euro como a única saída possível para a presente situação, havendo nesse mesmo espaço sempre a cautela de acrescentar que o facto de ser a única saída possível não significa que ela seja fácil nem isenta de sacrifícios. Significa apenas que é a única que, a prazo, permite perspectivar um futuro diferente e melhor. O tempo que isso levará dependerá da vontade dos portugueses e do modo como esse abandono do euro ocorrer. Nem todas as soluções são boas como adiante se explicará.

Mas fora deste espaço livre que é o das redes sociais e da blogosfera a questão tem sido praticamente tabu. Nenhuma estação de televisão ou de rádio aceita pôr o tema em agenda e os próprios partidos, com excepção do PCP, guardam sobre ele idêntico silêncio, apresentando sempre a manutenção no euro como um a priori óbvio e evidente, carecido de qualquer demonstração.

Das posições do CDS e do PSD não adianta muito falar. Hoje são contra, mas nada garante que o sejam amanhã. A firmeza deles sobre esta matéria não será nenhuma. E por isso é que posição deles é grave para todos os que buscam uma boa solução. De facto, nada pior nos poderia acontecer do que sair do euro sob a pata destes dois partidos.

Já para o PS o problema é muitíssimo complicado. A Europa está para o PS como a União Soviética estava para o PCP. Cortar com a Europa ou reconhecer o seu rotundo fracasso seria o mesmo que reconhecer a falência do seu próprio projecto. “A Europa connosco”, as ilusões sobre a construção europeia como uma zona de solidariedade e prosperidade sem par fazem parte da matriz genética do PS. Sem a Europa, como referencial imaginário – que para o PS funcionou como referencial substitutivo do mito imperial -, o PS não existe. E isso está-se notando já hoje, mesmo sem o partido ter feito esse debate ou sequer interiorizada a falência do projecto europeu, na incapacidade de apresentar uma real alternativa à presente situação, quer sob a liderança de Seguro, quer sob a de Costa ou de Assis, todos eles tolhidos pela ausência de saídas minimamente credíveis e susceptíveis de reverter a presente situação.

Se a posição do PS é apesar de tudo relativamente clara – advoga a mudança e simultaneamente a fidelidade a um conjunto de compromissos que efectivamente a impede – já o mesmo se não poderá dizer da posição do Bloco. O Bloco nega os compromissos mas simultaneamente apresenta um conjunto de propostas que não têm qualquer viabilidade prática de efectivação no quadro europeu tal como ele existe. Pugnar pela manutenção de Portugal no euro e simultaneamente advogar a reestruturação da dívida, eliminando parte dela e fazendo depender o pagamento da restante do crescimento das exportações são realidades incompatíveis como toda a gente sabe. Os “patrões do euro”, não vão certamente aceitar para Portugal uma solução que rejeitaram para os demais, que, de resto, nunca sequer tiveram a ousadia de a apresentar. Pelo contrário, o que a prática política recente comprova, é que esses “patrões” tendem a agravar as imposições a que os países devedores estavam submetidos.

Por isso, quem defender a manutenção no euro e simultaneamente não apresentar as alternativas a seguir em consequência da rejeição das propostas de redução da dívida e das políticas de crescimento, o que no fundo está a esconder é que para permanecer no euro é preciso respeitar o Memorandum da Troika que tenderá, pela sua própria natureza e com o tempo, a agravar o condicionalismo imposto aos Estados intervencionados.

Já o PCP admite, como consequência inevitável, a prazo mais ou menos curto, a saída do euro, mas, além de não insistir suficientemente nesta conclusão, nomeadamente ao nível do debate público, não desenvolveu politicamente as condições em que essa saída deveria ocorrer.
 
 
 
 
 
 

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