Carta aberta a uns pedaços de merda
Olá, amiguinhos do FMI. Eu sou o ratinho branco. Desculpem estar a
incomodar-vos agora que vocês estão com stress pós-traumático por terem lixado
isto tudo. Concluíram vocês, depois do leite derramado: "A austeridade pode ser
autodestrutiva." E: "O que fizemos foi contraproducente." Quem sou eu para
desmentir, eu que, no fundo, só fiquei com o canto dos lábios caídos, sem
esperança? O que é isso comparado com a vossa dor?! Eu só estiquei o pernil ou
apanhei três tipos de cancro, mas é para isso que servimos nos laboratório:
somos baratos e dóceis. Já vocês não têm esses estados de alma (ficar sem
emprego, que mau gosto...), vocês são deuses com fatos de alpaca e gravata
vermelha como esses três novos que acabam de desembarcar para nos analisar os
reflexos. "Corre, ratinho branco!", e eu corro. Vocês cortam-me as patas:
"Corre, ratinho branco!", e eu não corro. E vocês apontam nos vossos canhenhos
sábios: "Os ratos sem pernas ficam surdos." Como vocês são sábios! E humildes.
Fizeram-nos uma experiência que falhou e fazem um relatório: olha, falhou. Que
lição de profissionalismo, deixam-nos na merda e assumem. Assumir quer dizer
"vamos mudar-lhes as doses", não é? E, amanhã, se falhar, outro relatório: olha,
falhou. O vosso destino, amiguinhos do FMI, eu compreendo. Vocês são aves de
arribação, falham aqui, partem para ali. Entendo menos o dos vossos kapos
locais: em falhando e ficando, porque continuam seguros no
laboratório?
Os "vossos kapos locais"?!... Eu gosto muito de quase tudo o que escreve Ferreira Fernandes. Mas desta vez, acho que terá pecado por defeito. Quase tanto como o outro que chamou "cavaco" ao pobre do italiano Beppe Grillo. Não me fiz entender?! Pronto, então passo a explicar o meu ponto de vista.
Ora, considerando que FF terá pretendido disfarçar com o "kapa", o original "capo", referido à abreviatura de capotasto, palavra italiana que significa "cabeça do braço" e que todos sabemos que em Itália poucos relacionarão com o dispositivo - em português, surdina - que os maus executantes usam na clássica guitarra, para disfarçar a inabilidade da mão sobre as cordas, antes com a "habilidade" para chegar ao topo de uma qualquer hierarquia mafiosa, entendo que terá sido demasiado benevolente ao chamar "capos" aos nossos interlocutores com o FMI, que vão continuando "seguros no laboratório".
De facto, talvez FF tenha usado um raciocínio demasiado redutor e simplista para designar todo esse bando de "aves locais, vulgo abéculas", que vai ouvindo religiosamente e executando com inultrapassável religiosidade os ditames do FMI. Sendo Portugal um país de "capos", os exemplares a que FF se refere, jamais poderão ser assim, tão singela e incorrectamente definidos. Que ele me perdoe, já que as nossas estaturas serão incomparáveis, mas atrever-me-ei a sugerir-lhe que passe a utilizar uma expressão mais adequada, para designar, não a pirâmide formada por toda essa corja que vegeta no "laboratório" da nossa desgraçada infelicidade, mas o seu topo. Porque só nesse cume senil e pretensioso, nessa "esfíngica e egocêntrica figura", que obscenamente tem permitido a prossecução dos ensaios laboratoriais do FMI, está o mal de todos os nossos males:
IL CAPO DI TUTTI CAPI !!!...
Até breve
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